‘Nem herói intocável, nem vilão’: quem foi Plácido de Castro, o homem por trás da Revolução Acreana


Plácido de Castro, gaúcho que liderou fase final da guerra pelo Acre
Acervo Digital: Deptº de Patrimônio Histórico e Cultural – FEM
Nesta quarta-feira (6), o Acre celebra a Revolução Acreana, marco histórico que consolidou a luta pela anexação do território ao Brasil no início do século XX. No centro deste episódio, está a figura de Plácido de Castro, exaltado como herói acreano, mas que segundo historiadores, era, acima de tudo, um homem comum, com virtudes e um temperamento forte.
👉 Contexto: No dia 6 de agosto de 1902, há exatos 122 anos, iniciaram-se os confrontos da Revolução Acreana. Os conflitos entre brasileiros que ocupavam a região desde meados de 1870 e o governo boliviano a quem o território pertencia legalmente pelos direitos de exploração da terra já duravam pouco mais de três anos. O principal interesse dos dois grupos era a exploração do látex. Os confrontos só acabaram em 1903 com a anexação do Acre ao Brasil.
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Plácido de Castro foi o principal líder militar da chamada última fase da Revolução Acreana. Gaúcho, nascido em São Gabriel (RS), seguiu a carreira militar influenciado pela tradição da família, mas abandonou o Exército após se decepcionar com a derrota de seu lado na Revolução Federalista (1893-1895), conflito que opôs forças estaduais ao governo central.
Desiludido, ele veio para a Amazônia em busca de oportunidades na economia da borracha, como tantos outros brasileiros no final do século XIX. Por volta de 1895, já estava no território que viria a se tornar o Acre, atuando como agrimensor e demarcador de terras, graças à formação técnica que havia recebido na vida militar.
Em entrevista ao g1, o historiador Marcus Vinícius Neves explicou que Plácido de Castro foi por muito tempo “endeusado” pela historiografia local, muito em função do simbolismo da Revolução como ato de resistência da sociedade acreana frente à dominação boliviana, e, indiretamente, ao próprio governo federal brasileiro, que nomeava governantes sem conexão com a realidade regional.
“Ele foi superestimado em vários momentos, e seus defeitos muitas vezes foram deixados de lado em prol dessa imagem de herói. Mas ele era um homem do seu tempo: uma época marcada por forte autoritarismo, militarismo, patriotismo com outro sentido do que conhecemos hoje e uma sociedade extremamente masculinizada”, falou.
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MEDEIROS, Avelino Chaves. Exploração da Hevea / Acervo: Edunyra Assef / Acervo Digital: Dept° de Patrimônio Histórico e Cultural – FEM
Antes da liderança
Mesmo já vivendo na região, Plácido de Castro não participou da primeira insurreição acreana, em 1899, nem da criação do Estado Independente do Acre, liderado por Luís Galvez.
Ainda assim, acompanhava de perto os acontecimentos. Em 1900, teria recusado convite para participar da chamada “expedição dos poetas”, uma tentativa fracassada de retomada do controle da região.
”Imperador’ Galvez, jornalista espanhol, declarou independência do Acre
Giselle Lucena/Arquivo pessoal
Foi só em 1902, com o avanço do contrato entre Bolívia e Bolívia Syndicate, consórcio com participação dos EUA e Inglaterra, que Plácido aceitou liderar o movimento armado. Com uma condição: teria total autonomia, inclusive com autoridade para punir com morte qualquer desobediência.
A luta armada contra o exército boliviano foi o ápice de um conflito que se desenhava desde 1870, quando os primeiros brasileiros, vindos na maioria da região Nordeste do Brasil, começaram a ocupar a região do “Aquiry”, nome indígena que significa ‘rio dos jacarés’ e acabou dando nome ao estado.
Conflito
A chegada de Plácido de Castro ao Acre finalmente mudou a sorte dos brasileiros que desejavam se estabelecer no território.
“Quando Plácido de Castro, à frente de um exército de seringueiros, invade a cidade de Xapuri e a toma das autoridades, dá início a última fase da Revolução Acreana. A fase mais sangrenta, que levou os seringueiros a pegar em armas e ir a luta contra os bolivianos”, ressaltou Marcus Vinícius.
Segundo o historiador, até hoje não é possível saber com clareza quantas pessoas morreram no conflito e qual lado teve mais perdas, já que as histórias são divergentes.
Com apoio de seringueiros e financiadores do Amazonas, Plácido liderou um ousado movimento militar contra o domínio boliviano. Com estratégias e avanços arriscados, saiu vitorioso e consolidou o território como parte do Brasil.
Mapa mostra locais onde os revolucionários enfrentaram o exército boliviano
Acervo Digital: Dept° de Patrimônio Histórico e Cultural – FEM
Da glória à emboscada
O sucesso nas batalhas lhe deu grande prestígio político. Após a Revolução, ganhou reconhecimento do Barão do Rio Branco e se tornou uma figura central na política local.
Mas o Acre, transformado em território federal, passou a ser governado por prefeitos nomeados, o que levou Plácido a frequentes embates com as autoridades.
A tensão culminou em 1908, quando Plácido foi morto numa emboscada a caminho de seu seringal, o Capatará.
O crime teria sido encomendado pelo então prefeito departamental Gabino Besouro. O executor, segundo os relatos históricos, foi Alexandrino José da Silva, ex-comandado de Plácido na Revolução.
Legado
Plácido de Castro é, até hoje, lembrado como símbolo de coragem e determinação. Mas, segundo Marcus Vinícius Neves, é essencial compreendê-lo em sua totalidade.
Para o historiador, mais que anexação do território acreano ao Brasil, a Revolução deixou marcas culturais que podem ser notadas ao longo dos últimos 123 anos.
“Nem herói intocável, nem vilão. Apenas um homem complexo, produto do seu tempo e das contradições da história do Acre”, falou.
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