quinta-feira, maio 9, 2024
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Amizade tóxica: como identificar sinais e se afastar de uma relação sem traumas

Dizem que os amigos, celebrados nesta quinta (20), no Dia do Amigo, são a família que a gente escolhe. Mas assim como em qualquer relacionamento, é possível que essas amizades gerem situações tóxicas e que nos deixam com a sensação de que alguma coisa não vai bem.

 

E repetindo: você tem escolha, de ficar ou de ir.

 

Mas a decisão de se afastar não é tão fácil quanto parece. Por isso, pedimos ajuda de três psicólogas que explicam como identificar sinais de uma amizade tóxica e, principalmente, se livrar de uma.

Quais os sinais mais comuns de uma amizade tóxica?

Entre alguns sinais que podem servir de alerta, a psicóloga Ediane Ribeiro, especialista em trauma, emoções e comportamento, destaca:

 

  1. Crítica excessiva: tudo o que você faz, como se veste ou como se comporta é constantemente criticado pela outra pessoa. Muitas vezes, a crítica vem acompanhada de frases como: “Eu quero o seu bem”, “Só falo isso porque sou sua amiga” ou “Se eu não te falar a verdade, ninguém vai falar”.
  2. Humor depreciativo: a pessoa faz piadas e “brincadeiras”, inclusive em público, que depreciam ou menosprezam você ou características suas. E quando você manifesta desconforto ou insatisfação, escuta coisas como: “Que falta de senso de humor” e “É só uma brincadeira!”
  3. Tentativa de controle: tenta influenciar suas decisões nas diferentes áreas da sua vida e controlar com quem você deve ou não se relacionar.
  4. Violação de limites: você deixa de fazer coisas que gostaria ou assume compromissos que não gostaria para não desagradar, magoar ou irritar esse amigo. Se sente na obrigação de estar sempre disponível e compartilhar tudo da sua vida com a outra pessoa. Tem dificuldade de estabelecer seus limites, pois sente que isso pode prejudicar a amizade.
  5. Sobrecarga e falta de reciprocidade: a pessoa te procura geralmente para resolver os problemas dela ou para desabafar e descarregar as emoções dela em cima de você, mas nunca está disponível quando você precisa de escuta ou de um ombro para desabafar.
  6. Desvalorização: você não recebe incentivos dessa pessoa e ela não consegue celebrar suas conquistas. É comum que ela procure justificativas fora de você para suas conquistas e realizações em qualquer área da vida, como se você não fosse capaz ou merecedor. Aparecem frases do tipo: “Você deu sorte!” ou “Será que essa pessoa não está tentando te enganar?”
  7. Manipulação por demonstrações de afeto desproporcionais: ao contrário da falta de disponibilidade, a pessoa tem atitudes que parecem demonstrações de afeto extraordinárias, como te dar um presente muito caro que você não teria condições de retribuir, se “sacrificar” para te ajudar e sempre encontra uma forma de te lembrar dessas “dívidas”.

 

“As amizades tóxicas carregam relações egoístas, sentimento de posse pelo outro, desvalorizam as necessidades do outro, solicitam muita ajuda, mas retribuem pouco. Com frequência, eles nos deixam em situações desconfortáveis, manipuladoras e tendem a culpar a outra parte para esconder um erro se esquivando da responsabilidade de suas atitudes”, esclarece a psicóloga Rachel Campos.

 

Amizades tóxicas carregam relações egoístas, sentimento de posse pelo outro, desvalorizam as necessidades do outro, solicitam muita ajuda, mas retribuem pouco — Foto: Pexels

Amizades tóxicas carregam relações egoístas, sentimento de posse pelo outro, desvalorizam as necessidades do outro, solicitam muita ajuda, mas retribuem pouco — Foto: Pexels

A psicóloga Luisa Araruna explica que, em amizades saudáveis, deve haver reciprocidade: “Nós devemos sentir prazer de estar na presença do outro, devemos sentir segurança, encontrar apoio, troca. Em pares, nós sempre vamos ter características e atitudes que se complementam. Eu ajudo meu amigo com quem eu sou, com os meus pontos de vistas e minhas características, e ele me ajuda com tudo que ele é.”

 

“Isso não significa que alguém esteja nessa relação por obrigação, mas de forma inconsciente, um reforça o sintoma do outro. Um repete com o outro, recortes e padrões da sua vida familiar.”

 

No dia a dia, Luiza aconselha prestar atenção nos pequenos detalhes, como:

 

  • Se as conversas quase nunca são sobre você e suas questões, sonhos ou dores não encontram espaço nessa relação;
  • Quando é sempre você quem precisa se dedicar e reorganizar a sua agenda para atender às demandas “imediatas” do outro;
  • Quando você é humilhado ou descredibilizado quando não concorda e não aplaude as ideias do outro;
  • Quando você é objetificado e colocado em segundo plano;
  • Quando você é a pessoa que se preocupa, que cuida, que faz carinho, que arruma soluções…

Quais os problemas que uma amizade tóxica pode trazer?

Ediane explica que, além do desgaste emocional e do prejuízo para autoestima, uma amizade tóxica pode levar ao isolamento social:

 

“É comum que a pessoa vá interferindo nas outras relações e reduzindo a rede de apoio da outra. Pode levar à perda de oportunidades, restrições da autenticidade, aumento da ansiedade basal e até perdas financeiras. E depois de sair da amizade tóxica, ela pode deixar marcas, como dificuldade para estabelecer novas relações de intimidade pelo trauma sofrido.”

“Viver uma relação abusiva traz prejuízos emocionais como irritabilidade, tristeza, angústia, impulsividade, medo, perda de esperança. Todos esses sintomas são prejudiciais ao psicológico de cada pessoa”, completa.

 

Além do desgaste emocional e do prejuízo para autoestima, uma amizade tóxica pode levar ao isolamento social — Foto: Pexels

Além do desgaste emocional e do prejuízo para autoestima, uma amizade tóxica pode levar ao isolamento social — Foto: Pexels

“Amizades tóxica afetam o seu bem-estar, roubam sua energia e seu tempo”, diz Rachel.

 

“Dependendo do vínculo que se tem com essa pessoa, você pode receber retaliações e deve estar preparado para isso. Por exemplo, se essa amizade tóxica acontecia no trabalho, e agora você ainda precisa conviver com essa pessoa, ela pode fazer coisas para tentar te prejudicar nesse ambiente”, pontua Luisa.

 

Qual a melhor maneira de estabelecer limites em uma amizade?

“O aprendizado dos limites começa desde muito cedo, em nossas primeiras relações. Quanto menos experiência tivemos em relações com limites saudáveis desde muito pequenos, mais desafiador será estabelecer limites nas relações da vida adulta incluindo nas amizades”, explica Ediane.

 

“Para estabelecer limites saudáveis, você precisa buscar saúde emocional para reconhecer os próprios limites”, complementa Luisa.

Ediane explica que estabelecer limites requer prática, que pode se desenvolver em três etapas:

 

  • Identificar quais limites estão sendo violados: pode ser menos intuitivo que parece, por isso, vale gastar um tempo pensando sobre que necessidades suas não estão sendo atendidas nessa relação. O que é negociável e o que não é negociável para você. Lembrar que limites têm a ver com nossas necessidades e com encontrarmos formas de protegê-las. Não é sobre manipular o comportamento do outro.
  • Comunicar: depois de identificar seus limites, é hora de comunicar. Aqui, o grande desafio é lidar com o desconforto em desagradar ou agir diferente do que o outro espera de você. Vale exercitar antes, se imaginar na conversa e observar como seu corpo reage, perceber essas sensações de desconforto que se apresentam fisicamente sem tentar eliminá-las correndo. É um treino para que sua mente não tente resolver esse desconforto permitindo que seus limites continuem a ser violados.
  • Manter: a terceira etapa talvez seja a mais desafiadora e se relaciona muito com a anterior. A dificuldade em manter nossos limites vem do desconforto com o julgamento do outro ou com a insistência. Lembre que essa pessoa já convive com você há algum tempo e já espera de você alguns comportamentos. A mudança nem sempre será recebida e absorvida de primeira. Pode ser necessário informar seus limites mais de uma vez para a mesma pessoa e, principalmente, ter comportamentos compatíveis com o que você diz a ela.

 

Amizades tóxicas afetam o seu bem-estar, roubam sua energia e seu tempo, explica a especialista — Foto: Pexels

Amizades tóxicas afetam o seu bem-estar, roubam sua energia e seu tempo, explica a especialista — Foto: Pexels

O que pode levar alguém a permanecer em uma amizade tóxica?

“Reconhecer que se está em uma amizade tóxica não é tão simples quanto se imagina, pois, em geral, a amizade começa muito agradável e vai escalando para o abuso com o tempo”, esclarece Ediane. A psicóloga afirma que é normal a pessoa se sentir confusa, já que comportamentos abusivos de amigos se alternam com demonstrações casuais de afeto:

 

“Isso confunde quem vive a amizade e pode levá-la a se questionar se não está exagerando ou sendo ingrata.”

 

Um outro fator importante, segundo Ediane, é a referência de relações saudáveis da pessoa: “Se ela cresceu em relações onde existia desrespeito, abuso e violação de limites, terá mais dificuldade de reconhecer isso como um problema. É como se essa forma de se relacionar fosse mais familiar para ela.”

 

Luisa diz que insistir em uma relação tóxica pode ser prejudicial a longo prazo, considerando que uma das partes tende a sempre ceder: “A longo prazo, ela pode abrir mão de seus projetos e de outros relacionamentos, perdendo tempo de vida e deixando tudo de lado. Esse movimento ainda a deixa mais dependente por não ter construído muitas coisas para si.”

 

Como se livrar de uma amizade tóxica de forma saudável?

Ediane explica que há dois caminhos: a comunicação ou o afastamento por completo: “Tendo clareza de que a relação não está saudável para você, é o momento de decidir se isso será conversado com a outra pessoa ou não. Se há alguma maturidade para que vocês tentem ajustes na amizade ou se realmente a melhor opção é o distanciamento.”

“Nem sempre é fácil tomar essa decisão sozinho. Por isso, converse com pessoas em quem você confia e que te amam. Se sentir necessidade, o auxílio de um profissional também pode ser bem-vindo”.

 

Luisa explica que a ajuda psicológica pode ser buscada por ambas as partes, se elas estiverem dispostas a reconhecer traumas, mecanismos de defesa e padrões de comportamento: “Certamente elas poderão construir e reconstruir suas relações, mas não sem esforço. Esse processo não é fácil para ninguém, mas certamente é o mais saudável e libertador.”

 

Como se livrar de uma amizade tóxica de forma saudável? Há dois caminhos: a comunicação ou o afastamento por completo — Foto: Pexels

Como se livrar de uma amizade tóxica de forma saudável? Há dois caminhos: a comunicação ou o afastamento por completo — Foto: Pexels

Mas se a decisão for pelo afastamento, o mais importante é cuidar da sua saúde emocional, pois será natural sentir o desconforto quando a outra pessoa te procurar ou mesmo cobrar sua presença, pontua Ediane.

 

Ela aconselha planejar uma rotina que facilite esse distanciamento: “Faça programas diferentes, frequente lugares que te permitam conhecer outras pessoas, busque auxílio de familiares e outros amigos para passarem tempo juntos.”

 

“O término de uma amizade pode ser tão ou mais sofrido que o de uma relação amorosa e precisamos de suporte e apoio para lidar com as emoções que envolvem esse desafio.”

 

Como lidar com inveja e ciúmes de amigos?

Rachel afirma que é comum um amigo tóxico querer desestabilizar o outro, com uma relação de aproveitamento, culpabilidade, informações falsas ou levianas, ações egoístas, conflitos, fofocas e posturas desonestas. Além de, muitas vezes, haver falas agressivas ou até mesmo comportamentos agressivos — mesmo que a objetos — ao invés de confronto direto corpo a corpo.”

 

“Quando perguntamos se alguém sente inveja de amigos, a grande maioria das pessoas responde que não, mas quando a pergunta é se são invejados, também a grande maioria responde que sim”, define Ediane: “É interessante ver que a conta não fecha e que precisamos olhar com cuidado para essa percepção da inveja.”

 

É comum um amigo tóxico querer desestabilizar o outro, com uma relação de aproveitamento, culpabilidade, informações falsas ou levianas, ações egoístas, conflitos, fofocas e posturas desonestas — Foto: Unsplash

É comum um amigo tóxico querer desestabilizar o outro, com uma relação de aproveitamento, culpabilidade, informações falsas ou levianas, ações egoístas, conflitos, fofocas e posturas desonestas — Foto: Unsplash

Mas será que realmente você está lidando com um amigo invejoso?

  • Você percebe uma competição com você nas atitudes desse amigo?
  • Percebe que não pode contar?
  • Que suas conquistas e realizações o incomodam?
  • Ou que realmente ele tem atitudes que te colocam pra baixo?

 

“Se a resposta para essas perguntas é sim, a pergunta seguinte é: por que manter essa amizade?“, questiona a psicóloga.

 

“Algumas vezes, não é tão simples. Pode ser que essa pessoa tenha laços fortes com a sua família, ou você tenha também uma relação de trabalho que te impeça o afastamento completo. Nesses casos, a distância segura será mais emocional e psicológica do que física. Pode começar não compartilhando detalhes da sua vida com ela, tornando as conversas menos íntimas, ainda que cordiais.”

 

Como distinguir um conflito pontual de uma amizade tóxica?

“Em uma amizade conflituosa, podemos ter duas ou mais pessoas que frequentemente se encontram imersas em conflitos pessoais e isso interfere na amizade”, explica Luiza. “Mas ‘aos trancos e barrancos’, os envolvidos vão se percebendo, se apoiando e tentando criar soluções para os conflitos.”

 

Já em uma relação tóxica, a psicóloga esclarece que o conflito não é exatamente algo a ser resolvido, mas sim o que alimenta a relação: “Ambos se alimentam de seus lugares de dominar-servir, atividade-passividade ou sadismo-masoquismo, e acabam não percebendo que, na verdade, ambos estão adoecidos e apenas reforçando uma forma patológica de se relacionar.”

 

Como se recuperar dos traumas causados por uma amizade tóxica?

“No campo da terapia, a pessoa que passa ou passou por uma relação abusiva precisa da ajuda de um psicoterapeuta para resgatar sua autoconfiança, autoestima e seguir seu caminho, descobrindo que o problema estava no outro e não em si, como muitas vezes deve ter escutado por uma acusação infundada e desvalidada”, explica Rachel.

 

Luisa reitera: “Nem sempre o que a pessoa precisa é de conselhos racionais. Ela pode até ter a capacidade de enxergar racionalmente a toxicidade de uma relação, mas, por vezes, ela não sabe se colocar de outra forma. Todos esses padrões e marcas traumáticas precisarão ser revistas e ressignificadas, para que a pessoa reconstrua sua maneira de se ver, de se comportar e também de ver a outra pessoa”.

 

Em uma relação tóxica, o conflito não é exatamente algo a ser resolvido, mas sim o que alimenta a relação: — Foto: Unsplash

Em uma relação tóxica, o conflito não é exatamente algo a ser resolvido, mas sim o que alimenta a relação: — Foto: Unsplash

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