Por que a alopecia chama atenção das pessoas? Como a calvície feminina afeta a saúde mental

Você tem alopecia? Talvez você não tenha essa resposta definida ou ainda não se sinta encorajada a admitir. Falar sobre a alopecia ainda é um tabu para muitas mulheres, mas abrir o diálogo e compartilhar o conhecimento sobre as causas e possíveis tratamentos pode ser um ganho para quem ainda não tem o diagnóstico. Quanto mais cedo, mais chances de ter melhores resultados.

Algumas famosas já revelaram publicamente que têm alopecia e talvez nem imaginam o quanto ajudaram outras mulheres ao trazerem o tema para o centro de debate.

Não é apenas sobre estética. A calvície feminina também é sobre dor, trauma e autoestima.

 

E para abordar essas e outras questões, o gshow conversa com três mulheres que têm tido um papel fundamental nesse debate e que, por acaso, se tornaram influenciadoras ao usarem as redes sociais como canal de compartilhamento de experiências com a alopecia e de acolhimento.

Conheça um pouco mais sobre as histórias que se cruzam pela alopecia de Giovana Iniesta, do perfil Por Mais Fios (26,5 mil seguidores), de Patricia Vicenzi, do Alopeciando (12,6 mil seguidores) e de Gabriela Oliveira, do Minha Alopecia (12 mil seguidores).

O impacto inicial ao se chegar ao diagnóstico: alopecia!

 

Para algumas mulheres pode ser um baque, para outras, um alívio. Chegar ao diagnóstico da alopecia também pode ser um acalento. Com foi o caso de Giovana e Gabriela.

“Eu descobri 2016, quando tinha quase 26 anos. É até engraçado dizer, mas não foi um grande impacto, eu já imaginava que alguma coisa eu tinha. Desde os 16, 17 anos eu já desconfiava que tinha alguma condição capilar”, destaca Giovana, que chegou a buscar alguns médicos na época para detectar o problema, mas em vão.

“Vários especialistas usaram coisas que não davam resultado. Quando fui a uma médica em 2016, ela me deu essa expressão da alopecia androgenética. Foi aí que eu soube do diagnóstico, quando eu já estava meio sem expectativas e esperanças. De certa forma, foi um alívio”, explica a jornalista, que passou a saber como poderia tratar o problema: “Lidar com uma coisa que você não sabe o que é, na minha visão, é muito pior.”

Por que a alopecia chama atenção das pessoas? Como a calvície feminina afeta a saúde mental — Foto: Freepik

Por que a alopecia chama atenção das pessoas? Como a calvície feminina afeta a saúde mental — Foto: Freepik

A reação de Gabriela não foi muito diferente disso. O alívio também foi um marco no momento do diagnóstico. “Eu já havia passado tantos anos sofrendo com a imagem que a alopécia proporcionava para mim no espelho, que quando encontrei esse diagnóstico, foi um conforto. Eu realmente precisava saber o que era para saber como conduzir os tratamentos”, lembra ela.

“O diagnóstico, então, foi um acolhimento, uma virada de página. E foi nessa confirmação que surgiu o perfil Minha Alopecia, quando eu tive a certeza do que eu tinha”, explica a profissional de comércio exterior.

O objetivo, através dessa iniciativa, não era se tornar uma influenciadora digital: “Queria ajudar outras mulheres para que não demorassem tanto a ter o diagnóstico. Através de mim várias outras pediram biópsia, chegaram no diagnóstico mais cedo. Eu não só fui confortada com o meu diagnóstico, mas pude confortar outras mulheres.”

Já para Patricia Vicenzi, a notícia não foi recebida com a mesma tranquilidade. “O impacto foi ‘cruel’ o suficiente a ponto de eu me lembrar em detalhes, mesmo após 5 anos, daquele dia. Afinal, eu recebera o diagnóstico de calvície aos 23 anos de idade e o peso daquele estereótipo me avassalou”, explica a médica, acrescentando que começou cedo a alisar o cabelo quimicamente.

“Aos 15 anos de idade, desde que me lembro por gente, meu cabelo era ‘normalmente’ mais fino. A situação só começou a me incomodar quando os outros começaram a reparar nas falhas e no afinamento do meu fio. Foi por causa desses olhares e questionamentos alheios que fui buscar ajuda médica”, lembra Patrícia, que na época cursava o penúltimo ano de Medicina.

Falta representatividade

 

Para Gabriela, esse assunto poderia ter mais representatividade. E um dos seus questionamentos é por que mais mulheres, incluindo personalidades da mídia, não falam mais abertamente sobre as questões relacionadas à calvície feminina.

“Seria importante se mais famosas que têm e continuam escondendo falassem de forma mais aberta dos seus tratamentos, de como conduzem. Às vezes, as mulheres sentem que serão limitadas na vida profissional, em relacionamentos, tudo por conta de ter alopecia. Quando esse assunto vem à tona na mídia, nos sentimos de alguma maneira representadas”, ressalta.

Segundo ela, a conscientização da mulher que está passando por isso, de que não está sozinha, tem um aspecto confortante. “De que não a limita a chegar a altos postos de trabalho, de ter posições mais relevantes. E você também educa o restante da sociedade, porque a pessoa deixa de olhar para você com aquele olhar de ‘nossa! tadinha, está com problema, está careca’. Porque as pessoas te olham como coitadinha”, destaca Gabriela.

Giovana diz que se soubesse aos 17 anos que tinha alopecia, teria começado a tratar de forma efetiva mais cedo: “Isso teria me poupado vários folículos capilares, porque tempo, infelizmente, é cabelo. O tratamento é mais para evitar que piore e para dar um certo encorpamento nos fios que ainda existem nos folículos ativos. Eu gostaria muito de ter tido acesso a informações naquela época.”

E foi durante o caminho do trabalho que a jornalista passou por uma experiência marcante ao se ver exposta e decidiu criar o seu perfil no Instagram: “Uma pessoa em situação de rua veio me pedir dinheiro e eu disse que eu não tinha, continuei andando, e ele gritou: ‘está ficando careca!’. Foi quando tive a ideia do meu perfil, em março de 2018. Eu queria falar sobre o tema, criei como um desabafo mesmo, não esperava a repercussão que teve. Várias pessoas começaram a me seguir e a mandar relatos sobre as suas experiências.”

‘A calvície masculina já é normalizada’, destaca influenciadora

 

Fortalecer o debate é o passo inicial para normalizar a doença. “Ao entender que se trata de uma condição genética, que a gente luta contra, quanto mais falado for, mais normalizado vai ser”, destaca a dona do perfil Minha Alopecia.

“A calvície masculina já é normalizada, mas uma mulher com calvície as pessoas ainda olham estranho. Será que é por que não existem muitas mulheres com calvície na televisão? Não que elas precisem se manter calvas na TV, mas falar sobre isso, se posicionar da maneira como elas são, sem as maquiagens capilares, perucas, laces, enfim, ajuda. Eu sinto muita falta desse assunto vir mais à tona para a conscientização da população e também como um acolhimento para as mulheres que sofrem com isso.”

“Ao longo dos últimos anos, após o diagnósticos de vários famosos com alopecia, as pessoas estão comentando mais sobre o assunto, mas pouco se fala em quem recebe o diagnóstico, sobre o impacto psicossocial que um diagnóstico de alopecia tem nesse público. Pouco se fala do pós-diagnóstico e tudo o que está por trás: a vergonha, o medo, a autocobrança, os estigmas de imagem pessoais e interpessoais”, acrescenta Patricia.

A falta de mais informações também é um problema citado por Giovana, principalmente quando comparado aos casos dos homens. “As pessoas enxergam a calvície como algo muito natural dos homens, mas não sabem que mulher também pode ter. E é exatamente a mesma condição. E o fato de esse assunto ser mais discutido facilitaria a busca por diagnóstico”, reforça ela.

E o diagnóstico mais cedo vai ajudar com que muitas mulheres se aceitem de forma mais natural também. “Porque não fica aquela sensação de ‘por que só eu?’. Falta mais informações no senso comum mesmo, como sociedade em geral. Faltam profissionais capacitados dentro da dermatologia também para conseguir encaminhar”, afirma Giovana.

Por que a alopecia chama atenção das pessoas? Como a calvície feminina afeta a saúde mental — Foto: Freepik

Por que a alopecia chama atenção das pessoas? Como a calvície feminina afeta a saúde mental — Foto: Freepik

Como o diagnóstico da alopecia afeta a vaidade

 

“A vaidade é a primeira coisa que é afetada quando você começa a perceber os sinais da calvície”, afirma Gabriela Oliveira. Segundo a influenciadora digital, a vaidade não espera o diagnóstico chegar para ficar ferida: “Ela se fere todos os dias, quando você se olha no espelho e vê a sua imagem ali, modificando, seus fios caindo, aquela rarefação ficando enorme.”

Uma das estratégias que ela lembra, é a de cortar parte da cabeça nas fotos. “Mas então você vai se readaptando. Isso já me afetou muitas vezes na minha vida, tive um episódio de bullying na escola, é muito difícil. Às vezes, aquilo ali vira uma insegurança sua”, reforça.

Para Giovana, foi preciso um certo tempo: “Demorei bastante tempo para aprender a lidar com isso, porque o cabelo é muito importante para a mulher, né? Hoje em dia eu tento compensar de outras formas para que o cabelo não tenha um impacto muito grande na minha vida, então eu gosto de cuidar da pele, na roupa, no estudo, porque a autoestima não é só aparência, né?”

Da depressão à medicina: ‘Ressignifiquei a dor’

 

Hoje atuante na medicina, Patricia Machado Vicenzi lembra que a sua dor foi um impulso importante na decisão de seguir carreira. “Foi o meu grande impulso. Com o diagnóstico da alopecia, tive depressão. O meu refúgio foi contar a minha história e, através dela, ajudar outras mulheres que estavam passando pela mesma situação”, explica ela.

No primeiro momento, Patricia lembra das sensações que vieram à tona: “Tive vergonha, o fato de ter o cabelo fino não me incomodava até o tal cabelo fino ser nomeado com o tão temido nome: calvície. Sim, eu estava mais preocupada com o que os outros iriam pensar do meu diagnóstico do que com o próprio diagnóstico em si. Passado esse conflito inicial interno, eu tenha vivenciado medos, baixa autoestima e dúvidas, muitas dúvidas.”

Segundo ela, tudo passou a fazer sentido a partir do momento que decidiu compartilhar as suas experiências. “Eu ressignifiquei essa dor. Comecei em anonimato, pois na época haviam muitos estigmas de mim e para mim que foram sendo quebrados ao longo dos anos”, admite.

“A calvície, literalmente, me escolheu, pois a partir dela que descobri meu amor pelo estudo das doenças do cabelo e do couro cabeludo e resolvi seguir na área”, explica a dona do perfil Alopeciando, afirmando que nunca teve a pretensão inicial de ir para essa área: “As coisas foram se encaixando e fazendo sentido.”

O diagnóstico precoce da alopecia é um aliado para resultados bem-sucedidos

 

Para Patricia, o mais difícil após o diagnóstico é o convívio diário com a paciência. “Eu costumo brincar que basta um ‘susto’ para o cabelo cair, mas é necessário um ‘exército’ para crescer novamente. Lidar com a espera de resultados e com a expectativa é desafiador”, destaca ela.

E é importante reforçar, como já dito anteriormente, que não é apenas sobre estética. O fator emocional tem um forte efeito por trás do diagnóstico. “Os olhares só me incomodaram quando o meu próprio olhar sobre mim me incomodava. A partir do momento que eu mudei a minha autopercepção, coincidentemente ou não, os olhares externos também mudaram”, destaca Patricia.

“E não se engane! As pessoas ainda olham e fazem questionamentos sobre o meu cabelo. O que mudou foi a importância que eu passei a dar para isso. E precisamos urgentemente falar sobre alopecia e acolher esses sentimentos.”

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